segunda-feira, 18 de fevereiro de 2008

VI Carta Revolucionária (luta concreta e urgente)

Comboio Lisboa/Santarém, 9 de Julho de 2007

Caríssimas Amigas e Amigos,
Caríssimas e Caríssimos Colegas,
Caríssimas e Caríssimos Camaradas,
Companheiras e Companheiros desta luta,

Apelo à Revolução de Setembro! Apelo a uma nova Revolução de Setembro:

· pela defesa duma educação pública e democrática do pré-escolar ao superior,
· pela defesa da Europa Social e por uma democratização da União Europeia,
· pela defesa da Democracia e do Serviço Público em todas as suas vertentes.

É provável que não seja viável fazê-la em Setembro(1) . Talvez em Outubro…. Embora não seja lá muito unitário fazer uma “nova revolução” em Outubro – A Revolução de Outubro faz 90 anos, em Novembro… Tem é de ser no último trimestre deste ano: são os últimos meses da presidência portuguesa da UE e são os primeiros meses do ano lectivo após o novo Regime Jurídico das Instituições de Ensino Superior (RJIES).

É já após este Verão, mas há urgência em agir já. O descontentamento é generalizado a todas as políticas que atentam contra os serviços públicos e a democracia. Sectorialmente estão descontentes: os funcionários públicos em geral com a “lei da mobilidade”, os vários corpos constituintes da Comunidade Académica (investigadores, estuantes, docentes e funcionários não-docentes e não investigadores) com o RJIES, os utentes dos serviços de saúde de diversas regiões com o encerramento total ou parcial dos mesmos, os professores do ensino básico e secundário com estatuto da carreira docente, os estudantes do secundário com as “jaulas de substituição”.

A contestação do RJIES tem sido levada a cabo uma pequena ou pequenas vanguardas académicas constituídas maioritariamente por estudantes, embora contem com a participação de elementos oriundos dos demais corpos académicos.

Retomo hoje, dia 12, (em casa, Santarém) após ter participado com alguns membros do Movimento Pára a Lei na Manifestação da Função Pública. Este Movimento nasceu em torno da petição à Assembleia da República com o objectivo de, naturalmente, parar até Janeiro de 2008 a proposta de lei do governo que estabelece novo RJIES para haver a necessária discussão pública. Na manifestação uma das manifestantes perguntou-me o que era MCTE (na faixa convocámos concentração para a frente do Ministério a Ciência, Tecnologia e Ensino Superior). Fez então uma pergunta quase retórica Não é para o Ministério da Educação? De facto, esta divisão entre Ensino Superior e os demais níveis de educação não só quebra toda uma lógica de estratégia de conjunto para a Educação como, na prática, nos divide nesta luta.

Foi dividindo os vários corpos das IES que o Processo de Bolonha foi levado a cabo nas suas piores vertentes. A legislação surgiu tardia e fragmentada para confundir. Cada Escola estava preocupada consigo, cada docente com as suas cadeiras, cada licenciatura consigo, cada turma com o seu ano, cada estudante com o seu precurso… Nem todos agiram assim, nem em todo lado foi assim; mas o resultado dessa fragmentação está à vista… Não podemos deixar que nos dividam; não nos podermos limitar às gavetas onde nos guardaram.

Na manifestação, ouviam-se os gritos do costume. Isso já tem 30 anos comentavam em tom de brincadeira alguns manifestantes sobre palavras d’ordem. Está na hora, está na hora/ Do Governo se ir embora etc. etc. Está sempre na hora, mas nunca vai. As sondagens até podem mentir, mas acredito que o PS ganhava as eleições amanhã sem margem para dúvidas. As cidadãs e cidadãos embora de caso em caso estejam contra o Governo, nem vêem alternativa no outro partido do centrão (PSD) nem estão dispostas a “radicalizar o seu voto”.

As propinas, Bolonha, RJIES, estatutos das carreiras dos docentes, regime de mobilidade da Função Pública, Flexigurança, Estratégia de Lisboa, Tratado Constitucional/Tratado de Lisboa… Tudo isto se liga num rumo político legitimado pela inacção, pela alienação dos poderes do Estado para estruturas da UE não controladas directamente pelo voto das cidadãs e cidadãos europeus…
Após nova paragem, retomo, no meu regresso ferroviário de Lisboa para Santarém. Estamos já a 27 de Julho: na semana passada, ocupei a Segunda-feira com novo protesto contra o RJIES e o Domingo anterior e seguintes dias coordenando com a Anita (Ana Ferreira) um Workshop sobre Coesão Social Europeia no âmbito do IX Encontro da Federação de Associações de jovens Cidadãos da Europa (FACE). Isto não vem apenas justificar (em conjunto com os exames em curso) mais esta paragem na escrita, vem também a propósito do parágrafo anterior.

Ambos europeístas de esquerda, a Anita e Eu tivemos de esforçar-nos pela imparcialidade naquele workshop; até porque era o mais correcto. Mesmo assim, através das várias sessões surge, entre as conclusões e recomendações dos grupos de trabalho, por maiêutica e não por imposição, a seguinte recomendação de que me confesso relator:

As the goals of creating “more and better jobs” and achieving a “grater social cohesion” (established in the Lisbon Strategy) are not being given enough attention due to the instability the intergovernmental system causes: the EU should give more power to its Parliament. This empowerment of EU citizens trough the EP is very important to social cohesion. EU citizens would fell responsible for EU policies if the sole communitarian institution they vote (EP) got more power.

Foi através do meu Liceu que participei em três encontros da FACE e foi o mesmo Liceu de Santarém que organizou este IX encontro em conjunto com o Centro Europe Direct. As jovens cidadãs e cidadãos ficaram alojados na residência Andaluz do Politécnico de Santarém… Talvez divague, mas tudo isto se junta no meu pensamento: a Revolução de Setembro, a rede de liceus, a Constituição versus Carta Constitucional, Europa Social, luta anti RJIES, europeísmo de esquerda… Regressa-me o pensamento aos pátios do Liceu; daí projecto multidões cidadãs pelas ruas de Setembro, Outubro e Novembro: as várias vítimas da vaga anti serviço público e da rapina do poder cidadão para as instituições indirectissimamente comunitárias ao serviço do centro dos interesses.

O último trimestre deste ano tem de ser em grande!

Bruno de Góis
[1] O que é pena, pois recordo que a Revolução de Setembro de 1836 foi uma festa que começou com a recepção calorosa (no cais das colunas, em Lisboa) dos deputados da então esquerda (eleitos no Porto) e resultou na revogação da Carta Constitucional (reaccionária outorgada pelo rei) ao ser forçada a Rainha a jurar a democrática Constituição de 1822. A Constituição de 22 vigorou até ao fim de novo processo constituinte – origem da efémera Constituição de 1838 que sucumbiu ao contragolpe ordeiro. O Setembrismo tem entre os seus legados a moderna rede de liceus.

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